quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Algumas considerações sobre Cultura Alternativa


Para compensar a falta de textos autorais e para variar um pouco das matérias tão citado e extinto site Junkeria Nefesta, postarei algumas matérias e entrevista transcrita do meu acervo, provenientes de revistas e fanzines dos anos 80 e 90. A idéia é que este blog seja também uma fonte de pesquisa aos interessados pelas tendências musicais que permeiam os seus arquivos. Para estrear esta etapa escolhi um texto que faz um link com a entrevista da postagem anterior. Mas não se trata de um texto tirado de impresso e sim de um ensaio editado em 14/05/2001 numa lista de discussão (talvez do Sépia Zine), cujo autor assinava apenas como Donimo. Essas considerações soam um pouco ideológicas, mas ainda muito atuais já que não é de hoje que a cultura alternativa se perdeu nas mãos de uma juventude apática, amortizada pelo consumo e pela falta de ideais. Ainda acrescento que ela não virou só virou divertimento de burguês, mas também escapismo vulgar uma classe desprovida de beleza, educação e informação (fica a dica – sites de festas afins que mais parecem literalmente os portais do inferno).

É chegada a hora de questionarmos a chamada Cutura Alternativa, herança das agitações dos anos 60. Seu mérito foi apresentar-se como uma nova forma de expressão jovem, uma indignação em relação a um mundo cada vez mais desumano.

Mas, sejamos francos: a Cultura Alternativa transformou-se em um divertimento burguês, hedonismo justificado numa consciência que muitas vezes não existe. Ela é uma alternativa a que, se dentro dos meios onde se desenvolve, encontramos muito mais os idiotas do cotidiano (ainda mais arrogantes) do que pessoas verdadeiramente engajadas?

Toda identificação cultural exige uma devoção ou, pelo menos, um real interesse. Atualmente, nossa "Cultura Alternativa" vive de aparências; reduziu-se unicamente ao campo da moda. O parecer tomou o lugar do ser. E uma subcultura que não se propõe a criar nada, que não representa um inconformismo, tende a ser esmagada pelas idéias da maioria ou contaminar-se com elas. Não estou dizendo que "ser-alternativo" signifique enclausurar-se em determinado modo de vida ou guiar-se pelo comportamento de um grupo; não é isso! Deve haver uma identificação mínima entre o indivíduo e o grupo; do contrário, só há incoerência. E nosso mundo está farto de incoerências!

Que Cultura Alternativa é essa, que repete os mesmos vícios do dia-a-dia, que se perde em mesquinhez? Seriam seus únicos propósitos os escândalos, as brigas entre facções, o segregacionismo?

Os inimigos dos partidários alternativos são os próprios "alternativos", já que sua "cultura" é fraca e inconsistente demais para voltar-se contra a sociedade. No entanto isso não significa que tal cultura seja inofensiva : ela mexe nas feridas da ótica dominante, nega os preconceitos da maioria (ao mesmo tempo que cria os seus) e estabelece hábitos próprios. A promiscuidade e a violência, condenáveis para a opinião da hipócrita maioria, são permitidas e às vezes, são o grande chamariz dessas subculturas. Freqüentar o cemitério, pixar muros, mutilar-se são comportamentos bizarros de adolescentes sem rumo : é somente assim que as pessoas os vêem. Elas não conseguem enxergar nessas atitudes um exercício de liberdade, pois a importância da liberdade só é compreendida quando o autoritarismo impera ou quando há um clima de terror. Esse terror e essa repressão são sentidos por poucos (e imitados por muitos) em momentos de aparente tranqüilidade (como nossos dias). A mídia ajuda a dissipá-los.

Também é por isso que a Cultura Alternativa volta-se contra a mídia : pois ela não é um instrumento livre e não permite que a sociedade adquira consciência por si própria. A Cultura Alternativa, hoje, parece não ter sentido, pois as pessoas que vivem nela imersas nem sempre estão dispostas a lutar por ela. Muitas a encaram apenas como uma diversão excêntrica, sem procurar fortalecê-la, sem ter a consciência que essa pequena parcela da sociedade poderia tornar-se importante se desenvolvesse algo de novo e cultivasse o respeito à pluralidade e ao diálogo. Há também a presunção de alguns partidários que julgam que seus mundinhos são algo fora da sociedade e querem ver cada vez menos gente envolvida, pois isso garantiria que apenas "pessoas interessadas" participassem de uma determinada "cena". Quem pensa assim não está muito longe do totalitarismo.

Todo "movimento" deve estar disposto a degradar-se; deve colocar-se a prova. Se, ao final de um período, sobreviver com suas idéias iniciais quase intactas, isso provará que ele é legítimo e necessário. Sempre haverá os fúteis e os desinteressados (estrangeiros no underground), mas esses não suportam o "peso da cena" por muito tempo.

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