domingo, 31 de outubro de 2010

integridade

A vida todo ser humano é um caminho em direção a si mesmo, a tentativa de um caminho, o seguir de um simples rastro. Homem algum chegou a ser completamente ele mesmo; mas todos aspiram a sê-lo, obscuramente alguns, outros mais claramente, cada qual como pode. Todos levam consigo, até o fim, viscosamente e cascas de ovo de um mundo primitivo. Há os que não chegam jamais a ser homem, e continuam sendo rãs, esquilos ou formigas. Outros são homens de cintura para cima e peixes da cintura para baixo. Mas, cada um deles é um impulso em direção ao ser. Todos temos origens comuns; as mães; todos proviemos do mesmo abismo, mas cada um - resultado de uma tentativa ou de um impulso inicial ou tendo a seu próprio fim. Assim é que podemos entender-nos uns aos outros, mas somente a si mesmo pode cada um interpretar-se.
(Hermann Hesse)

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Premature Ejaculation - Rise (MAL6)

Dando continuidade a série The Lost Recording, a Malaise Music acabou de disponibilizar em seu catálogo mais uma gravação “perdida” do Premature Ejaculation, Rise - um trabalho do originalmente lançado em formato cassete em 1987. Esta edição também apresenta um bônus track; Come Organisation's Necrophilia, uma obscura fita de uma só faixa lançada na segunda metade de 1983.
Rise possui 12 faixas sendo que cada uma contém trechos de um debate transmitido por uma estação de rádio americana com a interferência de ruídos e efeitos de sintonia para outras estações. Algumas delas são títulos bem curtos, o que mostra que Rise, assim como os primeiros trabalhos do projeto, é uma obra bem caseira, ainda com uma sonoridade tosca e cheia de improvisações, mas que estranhamente faz emergir em nossa mente alguns pensamentos e sensações de desassossego.
Como a arte da capa original era xerocada, ela foi quase completamente perdida. No entanto ela precisou sofrer algumas alterações e adaptações. A foto que retrata a cena de uma decapitação realizada por um soldado do exercito japonês no período da Segunda Guerra Mundial (provavelmente de 1937), acabou ficando ainda mais dramática por conta da nova tonalidade escura.
Os nomes de alguns títulos também foram corrigidos, já que na fita original Rozz os escreveu a mão com alguns erros irrelevantes de inglês como, por exemplo, ‘Necrophila’ ('Necrophilia’) e 'Bussiness as Usual' (Business as Usual).
Este cuidado com os detalhes mostra o total respeito e capricho daqueles que querem preservar a memória deste grande artista que é injustamente lembrado apenas por ter sido um dos ícones da já tão deturpada cena “deathrock” (que deus ou diabo a tenha...). Desta maneira, é possível entender porque o PE, assim como os seus outros projetos de música mais abstrata, era o espelho mais fiel de sua subjetividade tumultuada e criativa que não comportava certos clichês. Intencionalmente ou não estes trabalhos servem ainda hoje para subverter e questionar a vida cotidiana pós-moderna cada vez mais poluída com músicas pastiche que passaram a ser a trilha sonora de milhares de almas mortas reduzidas a avatares cheios de retoques digitais e sentimentos líquidos.
Um item e tanto para aqueles que ainda vivem e conseguem fazer das suas próprias experiências incomodas e perturbadoras inspiração para irreversíveis estados de plenitude e elevação, como o próprio título sugere.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

the human condition

Está provado onde se vive e morre como sucata, é a maquinaria capitalista homicida que transita e comanda tudo em alta velocidade, livremente. Tudo flutua em ruídos altos, entre carnes mutiladas, templos amontoados. Se santifica a tragédia, se esquece da beleza da essência e ostenta-se a religião e os mais vulgares vícios como principais cúmplices. Faz parte da tradição judaico-cristã a aspiração masoquista dos santos, que desemboca na violência, na sede por sangue, no esquecimento do espírito, na deformidade dos corpos. Poderiam existir mártires; anjos calados, elfos sorridentes como o próprio delírio mais puro de alquimia e não soldados que marcham com sua sacolas cheias de desesperanças e se esquivam de balas perdidas - esses que talvez dão sentido falso sua própria vida acumulada em aterros sanitários, reguladas por instâncias de comércio, Estado, da produção escravista das fábricas ou promessas furadas de uma vida confortável inatingível. Eis a verdadeira história dos perversos, guardiões do niilismo, dos que se aproveitam da cegueira dos que não questionam os ideais da propriedade coletiva e acabam se curvando a promiscuidade absoluta e desprezando as nuances de um pensamento elevado que no fundo ecoa de forma incomoda qualquer imagem de asnos com cabresto. Sub a luz da vidraças de um galpão abandonado, jaz mais um santo bestial que escarra a glória do Império entre as fendas podres dos seus dentes que mal podiam comer.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

demo-cracia

todo idiota é cúmplice do filho da puta; o idiota é o otário que não tem cura

sábado, 2 de outubro de 2010

o pecado e sacrifício do "Christian Death"

As vésperas de desembarcar pela primeira vez em SP no dia 23/10 com sua Necro Sexual Tour, Valor Kand nunca mediu palavras e esforços para justificar a sua tomada ao nome "Christian Death". Eis aqui uma rara entrevista cedida por ele à um fanzine francês chamado Noir Marine (n°4) após um concerto em Dingwalls, em Londres, no dia 10 de Setembro de 1985, onde explica a repentina "saída" de Rozz Williams da banda e a tentativa de continuar tocando como Sin and Sacrifice, que por fim não acabou acontecendo, gerando assim muitas polêmicas, brigas judiciais até mesmo a cisão entre os fãs mais extremistas.

Você pode explicar a saída de Rozz?
Muito simples: ele não queria mais fazer rock. Já no ano passado, para fazer a turnê européia foi necessário convencê-lo. Com efeito, Christian Death acabou em 1982 após a lançamento do (álbum) Only Theatre of Pain. Rozz dizia que não queria mais fazer rock, mas em 1983 eu decidi reformar o grupo e aquilo foi bom, nós efetivamente trabalhamos e rendeu alguns concertos, em seguida Rozz quis parar de compor rock. Ele sempre considerou-se sobretudo um poeta e quis se envolver numa música mais industrial, no estilo Throbbing Gristle. Ainda fizemos dois shows e ele deixou o grupo. Nós o convencemos de fazer um último disco e foi Ashes, que ele considerava como a melhor coisa que fez na sua vida. Ele recomeçou a acreditar, fizemos muitos concertos nos EUA, incluindo o último em Los Angeles no Roxy que foi excelente, mas depois disso Rozz declarou que o grupo tinha atingido seu ápice e que não queria mais continuar. Tentei convencê-lo porque eu tinha um grande desejo de ir a Europa; ele disse “talvez”, então organizamos uma série de shows e duas semanas antes de partir ele disse “não, não tenho energia nem inspiração para fazê-lo”. Dissemos-lhe que respeitávamos o seu ponto de vista, mas queríamos realmente fazer esta turnê e que se necessário faríamos sem ele. Ele não acreditou em mim e quando partimos ele lamentou amargamente. E é por isso que agora cospe acima de nós. Ele muito influenciável, encontrou pessoas que o persuadiram o não nos seguir; seguiu os seus conselhos, mas ele é realmente temperamental, depressivo. Antes ele gostava muito de Paris e Amsterdã, onde agendamos de tocar sem ele. Ele vingou-se telefonando para algumas pessoas para falar mal de nós…Penso que ele se reparará por isso. Nós tínhamos um contrato a cumprir, deveríamos viajar e promover Ashes. Se não tivéssemos partido teríamos perdido muito dinheiro. Ele, além de não perder nada ganha sem nada fazer.

Onde ele está agora, em Los Angeles?
Sim, faz o que bem entende por lá…Ele é muito influenciável, como uma criança. Penso que ele lamenta, ele não acreditou que o grupo poderia sobreviver sem ele e isto o irrita. Por todo lugar onde tocamos as pessoas gostaram, mas não quero que ele seja infeliz. Sofremos e trabalhamos muito para o Christian Death e não queríamos que fosse para o nada. Foram dois anos de nossas vidas.

Porque manter o nome Christian Death?

Porque é a nossa propriedade. Foi registrado legalmente há dois anos e representa David, Gitane, Rozz e eu. Por esse motivo, mesmo sem Rozz, há direito porque pertencemos ao grupo por muito tempo e sobretudo porque é conhecido internacionalmente, graças a Catastrophe Ballet, que co-escrevi com Rozz. Respeito o fato de que Rozz tenha criado este nome, é por isso que tentamos agora impor o nome Sin and Sacrifício; espero que seja o nome sob o qual sejamos reconhecidos em 1986 e que não tenha mais a necessidade de citar o outro como referência.

O que você acha se Rozz reformar o Christian Death?
Não o fará porque nos deixou claro que tinha se cansado da música. Mas o adoramos, para nós é ainda um amigo. De qualquer modo temos direitos iguais sobre as partes, dado que ele escreveu as letras e eu, a música.

Havia um concerto previsto em Paris…

Havia mesmo cinco datas previstas, mas foram canceladas por Vasco (manager francês) quando soube que Rozz não vinha. É realmente estúpido porque as pessoas teriam vindo aos concertos mesmo assim e também porque Ashes venderia mais. Não há nada de mais, supliquei para que Rozz viesse. Ele é o meu melhor amigo, fiquei chateado pela forma como ele deixou-se influenciar. Não podia tomar em carga todos os problemas psicológicos e materiais. Não sei explicar o quanto gosto dele e o respeito, mas ele agiu como uma criança. Sei que neste momento ele me odeia, mas crescerá, evoluirá e retornará comigo. Espero voltar fazer música com ele, é meu maior desejo. O conheci há muito tempo, no início do Christian Death quando eu era cantor de uma banda chamada Pompei 99 e sempre fazíamos shows juntos, depois disso eles ficaram populares com Only Theatre of Pain. Para mim não é difícil cantar e, com modéstia, escrever, pois eu sempre fui influenciado por Rozz, a quem admiro muito a liberdade de ser ele mesmo, de fazer qualquer coisa e ser indiferente aos outros.

E o contrato com L'nvitation au Suicide?
Terminou. O cara responsável por esse selo nunca pagou-nos nada pelo Ashes que vendeu 20.000 exemplares, nem a parte do adiantamento. Yann Farcy é ligeiramente ultrapassado, tem uma organização insuficiente no seu trabalho. Quebramos o contrato; ele continua frequentemente nos chamando, prometendo dar-nos o dinheiro quem nunca vem. Infelizmente para os nossos fãs franceses, será necessário comprar os nossos discos em importadoras.

Para terminar, quais são os seus projetos de discos?
O K7 Decomposition of Violets (ROIR) acaba de sair, foi registrado quando Rozz estava ainda na banda. Um EP com quatro faixas saiu na Itália, chama-se The Wind Kissed Pictures, e um disco chamado Atrocities sairá em janeiro de 86 nos EUA e na Alemanha.