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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Uma temporada no inferno


Escuto-o a fazer da infâmia uma glória, da crueldade um atrativo. Pertenço à raça distante: meus pais eram escandinavos: faziam incisões nas costas, bebiam o sangue. - Farei entalhes por todo o corpo, me tatuarei, quero me tornar assustador como um mongol: vais ver, berrarei pelas ruas. Quero me tornar louco de raiva. Nunca me mostre jóias, vou me arrastar e retorcer no tapete. Minha riqueza, gostaria de manchá-la de sangue por toda parte. Nunca trabalharei... Muitas noites, seu demônio me tomando, rolamos juntos, lutava com ele! Seguido ele me aguarda à noite, bêbado, numa rua ou sob um teto, para me amedrontar mortalmente. - Vão me cortar o pescoço mesmo, que nojo. Oh, os dias em que quer andar com a aura do crime!
Às vezes fala, numa espécie de gíria enternecida, da morte que faz se arrepender, dos infelizes que sem dúvida existem, dos trabalhos penosos, das separações que dilaceram os corações. Nas espeluncas onde nos embriagamos, chorava observando os que estavam em volta, gado de miséria. Levantava os bêbados nas ruas escuras. Tinha a piedade de uma mãe malvada pelos filhinhos. - Ia embora com gentilezas de menina aprendendo o catecismo. - Fingia estar a par de tudo, comércio, arte, medicina. - Eu o seguia, era preciso.
Eu via todo o ambiente no qual, em espírito, se envolvia: roupas, lençóis, móveis: eu lhe dava força, uma outra figura. Via de tudo o que tocava, como se tivesse querido criar cada coisa por ele mesmo. Quando me parecia com o espírito inerte, eu o seguia em ações estranhas e complicadas, longe, boas ou más: estava segura de nunca entrar em seu mundo. Ao lado de seu querido corpo adormecido, quantas horas noturnas de vigília, me perguntando por que ele queria tanto se evadir da realidade.
(...) Como isso te soará engraçado quando eu não estiver aqui, isso por que passaste. Quando não tiveres mais meus braços em volta do pescoço, nem meu peito para nele descansares, nem minha boca fechando-te os olhos. Porque é preciso que eu vá embora, para longe, um dia.

(Arthur Rimbaud)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

gênio


Ele é o afeto e o presente pois abriu a mansão ao inverno espumante e ao rumor do verão, ele que purificou a bebida e os alimentos, ele que é o charme dos lugares em fuga e a delícia super-humana das estações. Ele é afeto e o futuro, a força e o amor que nós, pisando sobre ódios e tédios, vemos passar num céu de tempestades e bandeiras de êxtase. Ele é o amor, na perfeita medida reinventada, razão maravilhosa e imprevisível, e a eternidade: adorável máquina de qualidades fatais. Sentimos o terror de sua concessão e da nossa: ó prazer de nossa saúde, élan de nossos sentidos, afeto egoísta e paixão por ele, ele que nos ama em sua vida infinita... E nós o invocamos e ele viaja... E se a Adoração se vai, soa, sua promessa ressoa: "Para trás essas superstições, esses corpos antigos, esses casais e idades. Esta é uma época que naufragou!" Ele não irá mais embora, nem de novo descerá de nenhum céu, e nem completará a redenção das raivas femininas e das alegrias dos homens e de todo este pecado: porque está feito, ele estando, estando amado. Ó seus suspiros, suas cabeças, suas corridas; a terrível velocidade da perfeição das formas e da ação. Ó fecundidade do espírito e a imensidão do universo! Seu corpo! A liberação sonhada, a explosão da graça invadida por uma nova violência! sua visão, sua visão! Todo velho ajoelhar e as penas se absolvem à sua passagem. Seu dia! a abolição de todos sofrimentos sonoros e móveis de uma música mais intensa. Seu passo! as migrações mais vastas que as antigas invasões. Ó ele e nós! o orgulho mais bondoso que as caridades perdidas. Ó mundo! cristalina canção de novas sinas. Ele nos conheceu a todos e todos amou. Saibamos, nesta noite de inverno, de cabo a cabo, do polo turbulento ao castelo, da multidão à praia, de olhar a olhar, força e afetos lassos, chamá-lo, e vê-lo, e mandá-lo embora, e sob as marés e de cima dos desertos de neve, seguir suas visões, seu sopro, seu corpo, seu dia.

Arthur Rimbaud

terça-feira, 23 de março de 2010

lamento de fim de tarde


"Escrevia silêncios, noites, anotava o inexprimível.
Fixava vertigens.
Criei todas as festas, todos os triunfos, todos os dramas.
Tentei inventar novas flores, novos astros, novas carnes, novos idiomas."


Text: Arthur Rimbaud
Collage: me

sábado, 30 de janeiro de 2010

assim ?

O poeta faz-se vidente através de um longo, imenso e sensato desregramento de todos os sentidos.

(Arthur Rimbaud)