sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Paganismo - por hakim bey


CONSTALAÇÕES POR ONDE dirigir o barco da alma.
"Se o muçulmano entendesse o Islã ele se tornaria um idólatra" - Mahmud Shabestari

Elegbá, o porteiro horroroso com um gancho na cabeça & conchas no lugar dos olhos, charutos negros de macumba & copo de rum – como Ganesh, o deus dos Inícios, garoto gordo com cabeça de elefante que cavalga um rato.
O órgão que sente as atrofias numinosas com os sentidos. Aqueles que não podem sentir baraka(1) não podem conhecer a carícia do mundo.
Hermes Poimandres ensinou a animação dos eidolons(2),a incorporação mágica de ícones por espíritos — as aqueles que não podem realizar esse ritual em si mesmo & em todo o tecido palpável de ser material vão herdar apenas melancolia, dejetos, decadência.
O corpo pagão torna-se uma Corte de Anjos que experimenta este lugar – este arvoredo – como o paraíso – (“Se existe um paraíso, com certeza é aqui!” – inscrição no pórtico de um jardim mongol).
Mas o anarquismo ontológico é paleolítico demais para escatologia – as coisas são reais, feitiçaria funciona, os espíritos dos arbustos são unos com a Imaginação, a morte é um vago desconforto – o enredo das Metamorfoses de Ovídio – um épico de mutabilidade. O cenário mitológico pessoal.
O paganismo ainda não inventou leis – apenas virtudes. Sem sacerdócio, sem teologia ou metafísica ou moral – apenas um xamanismo universal no qual ninguém obtém real humanidade sem uma revelação.
Comida dinheiro sexo sono sol areia & sensimilla (3) - amor verdade paz liberdade & justiça. Beleza. Dionísio o garoto bêbado em uma pantera — rançoso suor adolescente — Pã homem-bode abre caminho através da terra sólida até sua cintura como se estivesse no mar, sua pele incrustada de musgo & líquen — Eros se multiplica em uma dúzia de jovens pastorais nus de Iowa, com pés sujos de barro & musgo dos lagos em suas coxas.
Raven, o trapaceiro do potlatch (4), às vezes um garoto, às vezes uma velha, um pássaro que roubou a lua, agulhas de pinho flutuando num lago, totem de Faísca & Fumaça, coro de corvos com olhos de prata dançando na pilha de lenha — o mesmo que Semar, o corcunda albino hermafrodita marionete de sombras, patrono da revolução Javanesa.
Iemanjá, estrela azulada, deusa marinha & madrinha dos homossexuais — como Tara, aspecto azul-acinzentado de Kali, colar de crânios dançando dançando no rígido lingam (5) de Shiva, lambendo nuvens de monções com sua língua compridissíma - como Loro Kidul – deusa-do-mar verde-jade javanesa que confere o poder da invulnerabilidade aos sultões por meio de intercurso tântrico em torres & cavernas mágicas.
Sob um ponto de vista, o anarquismo ontológico é extremamente nu, despido de todas as qualidades & possessões, pobre como o próprio CAOS – mas, sob outro ponto de vista, ele pulula de barroquismos como os templos da foda de Katmandu ou um de símbolos alquímicos – esparrama-se em seu divã comendo loukoum (6) & acolhendo noções heréticas, uma mão dentro de suas calças frouxas.
Os cascos de seus navios piratas são laqueados de negro, as velas triangulares são vermelhas, bandeiras negras exibindo uma ampulheta alada.

5 – nome que em Cuba se dá a Exu.
6 – conceito sufista, que significa benção, graça, a força vital de toda criação.
7 – Ou H. Trismegisto, mitológico fundador do hermetismo, doutrina ligada ao gnosticismo, no Egito, século I.
8 – Festival de inverno celebrado pelos índios da costa noroeste dos EUA, com distribuição e eventual dissipação dos bens do anfitrião.
9 – O mais importante dos símbolos de Shiva, que tem a forma de um falo, e representa o aspecto impessoal de Deus.
10 – Doce turco.

Nenhum comentário:

Postar um comentário